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Cronus1

Saturno, arte romana, século I

Cronos ou Crono (do grego Κρόνος, Krónos) era o líder e o caçula da primeira geração de titãs, os filhos de Urano e Gaia, que depôs o pai e governou o universo durante uma mitológica Idade de Ouro, segundo Os Trabalhos e os Dias de Hesíodo e depois foi derrubado por seus filhos Zeus, Hades e Poseídon e aprisionado no Tártaro, segundo a Teogonia do mesmo autor. Cronos foi depois perdoado pelo filho e enviado para governar os Campos Elísios, no fim do mundo, segundo Hesíodo, Píndaro e outros autores.

Foi identificado pelos romanos com sua divindade Saturno e com divindades semitas como El (principalmente na forma de El Olam, "El do Eterno Tempo", ao qual os fenícios sacrificavam crianças), Hammon, Moloch e Javé.

Etimologia

Κρόνος, Krónos não possui uma etimologia segura. A aproximação com o verbo kraínein, "concluir, vibrar o último golpe", é etimologicamente improvável.

A etimologia popular, no período helenístico e na Renascença, relacionou Κρόνος, Krónos com Χρόνος, Khrónos, "Tempo". Essa aproximação, que não faz sentido do ponto de vista linguístico (em grego, as duas palavras são foneticamente distintas), foi influenciada pela ideia de o deus ter reinado em "priscas eras", o que fez dele sinônimo de um passado incomensurável e com a ideia do "tempo que tudo devora", inspirada pela analogia com o mito no qual devora os próprios filhos.

Genealogia

Em quase todas as versões do mito, Cronos é filho de Urano e Gaia. Apenas um resumo do prefácio do pseudo-Higino parece considerá-lo filho de Éter e Gaia, mas isso pode se dever a um erro do autor da sinopse.

Também concordam todos os autores em que, com Reia, Cronos foi pai de Héstia, Deméter, Hera, Hades, Posídon e Zeus.

Com a oceânida Fílira, Cronos foi pai do centauro Quíron, conforme indicam várias fontes, incluindo a Titanomaquia de Eumelos, o pseudo-Apolodoro, Apolônio de Rodes, o pseudo-Higino, Ovídio, Virgílio e Plínio. Segundo o pseudo-Higino, essa parceira também teria lhe dado como filho o (aparentemente) humano Dólops e, segundo Suidas, o ictiocentauro Afros, rei da Líbia e ancestral dos cartagineses. Alguns mosaicos romanos também o associam com outro ictiocentauro, Bitos.

Estrabão cita Cronos como pai dos Coribantes e Ovídio o dá como pai de Picus.

Iconografia

Devido a sua associação com a virtuosa Idade de Ouro, Cronos foi adorado como uma divindade das colheitas, associada aos grãos, à natureza e à agricultura. Era usualmente representado com uma foice, que usava para fazer as colheitas e que também era a arma que usou para castrar e depor Urano.

Culto

Em Atenas, no 12º dia de cada mês, um festival chamado Crônia era celebrado em honra de Cronos e da colheita.

Mitos

Mutilacao de Urano

A Mutilação de Urano por Saturno, de Giorgio Vasari e Gherardi Christofano (século XVI)

  • Urano, tão logo nasciam os filhos, devolvia-os ao seio materno, temendo ser destronado por um deles. Gaia resolveu libertá-los e pediu aos filhos que a vingassem e afastassem do esposo. Cronos, que odiava o pai, aceitou a incumbência. Gaia entregou-lhe uma foice (instrumento que corta as sementes) e quando Urano, ávido de amor, se deitou sobe a esposa, Crono cortou-lhe os órgãos sexuais.
  • Senhor do universo, Cronos se casou com a irmã Reia. Temendo os ciclopes que Urano lançara ao Tártaro e que ele havia libertado a pedido da mãe, novamente os aprisionou nas trevas inferiores, junto com os Hecatonquiros.
  • O centauro Quíron nasceu da união do deus Cronos e da ninfa Fílira, que estavam em plena cópula quando surgiu Reia, a esposa de Cronos. Este tomou a forma de um cavalo para se disfarçar e o filho da ninfa nasceu meio homem, meio cavalo.
Rheacronus

Reia apresenta a Cronos uma pedra envolvida em cueiros no lugar de Zeus. Relevo de mármore de 400 a.C., no museu Capitolino

Rubens saturn

Cronos, pai de Zeus, devora um de seus filhos, Posídon, de Peter Paul Rubens (1636)

Saturno devorando a sus hijos

Saturno devorando seus filhos, de Francisco de Goya (1819-1823). Vale observar que o crítico Fred Licht pôs em dúvida o título tradicional da obra, que não foi dado pelo autor, pois "Saturno" não exibe nenhum de seus atributos tradicionais e a vítima não parece uma criança.

  • Como Urano e Gaia, depositários da mântica, vale dizer, do conhecimento do futuro, lhe houvessem predito que seria destronado por um dos filhos que teria de Reia, passou a engoli-los à medida que iam nascendo: Héstia, Deméter, Hera, Hades e Posídon. Escapou somente Zeus. Grávida deste último, Reia fugiu para a ilha de Creta e lá, secretamente, no monte Ida ou Dicta, deu à luz o caçula. Envolvendo em panos de linho uma pedra, deu-a ao marido, como se fosse a criança, e o deus, de imediato, a engoliu, como conta a Teogonia:
Reia submetida a Crono pariu brilhantes filhos:
Héstia, Deméter e Hera de áureas sandálias,
o forte Hades que sob o chão habita um palácio
com impiedoso coração, o troante Treme-terra
e o sábio Zeus, pai dos Deuses e dos homens,
sob cujo trovão até a ampla terra se abala.
E engolia-os o grande Crono tão logo cada um
do ventre sagrado da mãe descia aos joelhos,
tramando-o para que outro dos magníficos Uranidas
não tivesse entre os imortais a honra de rei.
Pois soube da Terra e do Céu constelado
que lhe era destino por um filho ser submetido
apesar de poderoso, por desígnios do grande Zeus.
E não mantinha vigilância de cego, mas à espreita
engolia os filhos. Reia agarrou-a longa aflição.
Mas quando a Zeus pai dos Deuses e dos homens
ela devia parir, suplicou-lhe então aos pais queridos,
aos seus, à Terra e ao Céu constelado,
comporem um ardil para que oculta parisse
o filho, e fosse punido pelas Erínias do pai
e filhos engolidos o grande Crono de curvo pensar.
Eles escutaram e atenderam à filha querida
e indicaram quanto era destino ocorrer
ao rei Crono e ao filho de violento ânimo.
Enviaram-na a Licto, gorda região de Creta,
quando ela devia parir o filho de ótimas armas,
o grande Zeus, e rcebeu-o Terra prodigiosa
na vasta Creta para nutri-lo e criá-lo.
Aí levando-o através da veloz noite negra atingiu
primeiro Licto, e com ele nas mãos escondeu-o
na gruta íngreme sob o covil da terra divina
no monte das Cabras denso de árvores.
Encueirou grande pedra e entregou-a
ao soberano Uranida rei dos antigos Deuses.
Tomando-a nas mãos meteu-a ventre abaixo
o coitado, nem pensou nas entranhas que deixava
em vez da pedra o seu filho invicto e seguro
ao porvir. Este com violência e mãos dominando-o
logo o expulsaria da honra e reinaria entre imortais.
  • Segundo Os Trabalhos e os Dias de Hesíodo, Cronos criou a primeira raça humana. Seu domínio foi a Idade de Ouro, durante a qual os humanos não precisavam trabalhar, pois "a terra lhe dava seus frutos em abundância e sem restrições sem precisar ser forçada" e viviam sem sofrer com tristezas, aflições ou a velhice. "Com braços e pernas sempre fortes, festejavam com alegria, fora do alcance de todos os males". Morriam serenamente, como quem dorme e depois da morte se transformavam em daimones benfazejos (daimones hagnoi) que existem sobre a terra (epikhthonioi) como guardiões dos mortais que punem as crueldades e proporcionam riquezas agrícolas. Segundo Calímaco, nesse tempo os animais falavam; Zeus, ao tomar o poder, tirou-lhes essa faculdade.
  • Uma vez crescido Zeus, ajudado por Gaia (segundo Hesíodo), ou por Métis (segundo o pseudo-Apolodoro). Segundo este, ela fez Cronos ingerir uma poção mágica que o forçou a vomitar a pedra (que se tornou o Ônfalo, a pedra em Delfos que representava o centro do mundo, o umbigo de Gaia) e todos os filhos anteriormente devorados. Comandados por Zeus, os deuses olímpicos iniciaram uma luta de dez anos contra os titãs. Por fim, venceu o caçula de Reia. Os titãs, expulsos do céu, foram lançados no Tártaro. Para obter o triunfo, Zeus, a conselho de Gaia, libertou os ciclopes e os hecatonquiros, que se se estabeleceram em palácios no rio Oceano, como guardiões das portas do Tártaro e carcereiros dos inimigos derrotados. Na versão da Teogonia:
Rápido o vigor e os brilhantes membros
do príncipe cresciam. E com o girar do ano,
enganado por repetidas instigações da Terra,
soltou a prole o grande Crono de curvo pensar,
vencido pelas artes e violência do filho.
Primeiro vomitou a pedra por último engolida.
Zeus cravou-a sobre a terra de amplas vias
em Delfos divino, nos vales ao pé do Parnaso,
signo ao porvir e espanto aos perecíveis mortais.
E livrou das perdidas prisões os tios paternos
Trovão [Brontes], Relâmpago [Estérope] e Arges de violento ânimo,
filhos de Céu a quem o pai em desvario prendeu;
e eles lembrados da graça benéfica
deram-lhe o trovão e o raio flamante
e o relâmpago que antes Terra prodigiosa recobria.
Neles confiante reina sobre mortais e imortais.
  • Segundo Ésquilo, Cronos, ao ser deposto, lançou sobre o filho vitorioso uma maldição pela qual também Zeus seria deposto por um de seus filhos. Entretanto, Prometeu advertiu Zeus a tempo de evitar unir-se com a nereida Tétis, pois o filho dessa união estaria destinado a derrubá-lo. Com isso, Zeus perdoou Prometeu de seus antigos agravos e permitiu a Héracles que o libertasse do tormento ao qual o havia condenado.
  • Segundo Os Trabalhos e os Dias de Hesíodo, Zeus criou a quarta raça humana, a dos heróis. Alguns deles morreram nas guerras de Tebas e de Troia, mas a outros o senhor do Olimpo deu uma morada nos confins da terra, nas Ilhas Afortunadas, onde vivem livres de tristezas, como na Idade de Ouro "e Cronos os governa, pois o pai dos homens e dos deuses o libertou de sua prisão". A Ode Olímpica de Píndaro acrescenta:
Quando eles morrem, corações impiedosos pagam a penalidade devida; um juiz julga sob a terra os pecados deste mundo e uma necessidade terrível dita a palavra da perdição
Mas o bom, pelas noites e dias sem fim, sob a brilhante luz do sol, não trabalha o solo com suas mãos, nem o mar largo por uma vida pobre, mas desfruta uma vida sem labuta; com os humanos honrados pelos céus, que mantêm alegremente a palavra jurada, passam uma era livre de lágrimas, enquanto os injustos suportam a dor como nenhum olho aguentaria ver.
Mas aqueles que têm a grande coragem, três vezes de cada lado da morte, de manter seus corações imaculados de toda a injustiça, estes viajam pela estrada de Zeus à torre de Cronos. Lá estão as Ilhas Afortunadas, brincam os ventos do Oceano e ardem flores douradas. Alguns desfrutam as águas, outros a terra de árvores gloriosas e tecem grinaldas e coroas de flores com suas mãos, sob os justos decretos de Radamanto, sentado à destra do grande pai, marido de Reia, deusa que tem o mais alto de todos os tronos.
Idadedeouro

A Idade de Ouro, de Franz Catel (1778-1856) e J. J. Rubby (1750-1812)

Referências

  • Junito de Souza Brandão, Dicionário Mítico-Etimológico da Mitologia Grega, Vozes, Petrópolis 2000
  • Theoi: Cronus [1]
  • Wikipedia (em inglês): Cronus [2]
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